Dói muito mais arrancar um cabelo a um europeu
que amputar uma perna, a frio, a um africano.
Passa mais fome um francês com três refeições por dia
que um sudanês com um rato por semana.
É muito mais doente um alemão com gripe
que um indiano com lepra.
Sofre muito mais uma americana com caspa
que uma iraquiana sem leite para os filhos.
É mais perverso cancelar o cartão de crédito a um belga
que roubar o pão da boca a um tailandês.
É muito mais grave deitar um papel para o chão na Suíça
que queimar uma floresta inteira no Brasil.
É muito mais intolerável o shador de uma muçulmana
que o drama de mil desempregados em Espanha.
É mais obscena a falta de papel higiénico num lar sueco
que a de água potável em dez aldeias do Sudão.
É mais inconcebível a escassez de gasolina na Holanda
que a de insulina nas Honduras.
É mais revoltante um português sem telemóvel
que um moçambicano sem livros para estudar.
É mais triste uma laranjeira seca num colonato hebreu
que a demolição de um lar na Palestina.
Traumatiza mais a falta de uma Barbie uma menina inglesa
que a visão do assassínio dos pais a um menino ugandês
e isto não são versos; isto são débitos
numa conta sem provisão do ocidente.
Fernando Correia Pina
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