Blog dum gajo do Porto acerca de gaijas, actualidade política e sem futebol. Aqui o marmelo não gosta de futebol

quarta-feira, 21 de dezembro de 2005

E numa manhã de Outubro, estava já frio, parti. Penalva ficava no alto de um monte. Chego na camioneta com a mala, conheço a casa, é na Rua do Marquês, já lá tinha vindo com as minhas tias a combinar. Bato à porta, a senhora Guilhermina espreita a uma janela, é uma cidade quase deserta, imóvel na eternidade. O trinco da porta estala, eu subo uma larga escada de madeira. A senhora Guilhermina está ao alto, imóvel, os braços crescem-lhe para os lados, um sorriso cresce-lhe na boca. Dá-me muitos beijos calados, diz-me em voz soprada que
- Não faças barulho.
Os meus sapatos rangem no soalho.
- Não faças barulho!



Ferreira, Vergílio, Para sempre, romance, 2 edição,
Livraria Bertrand, Lisboa 1983, pp. 57-61




Sim, sei bem
Que nunca serei alguém.
Sei de sobra
Que nunca terei uma obra.
Sei, enfim,
Que nunca saberei de mim.
Sim, mas agora,
Enquanto dura esta hora,
Este luar, estes ramos,
Esta paz em que estamos,
Deixem-me crer
O que nunca poderei ser.

Fernando Pessoa

Sem comentários: