Blog dum gajo do Porto acerca de gaijas, actualidade política e sem futebol. Aqui o marmelo não gosta de futebol

domingo, 3 de dezembro de 2006

[Anna Szulc, excertos de artigo para o Przekroj, Varsóvia, via Courrier Internacional - transcrição integral aqui: http://wordpress.com/tag/politica-e-economia/feed/

“Um exemplo: Janina Wojcik, de Cracóvia, boa esposa e mãe, com boa apresentação, trabalhadora. Regularmente violada pelo cônjuge. Todos os vizinhos estavam ao corrente do seu calvário, mas nenhuma das autoridades a quem a pobre mulher pediu ajuda fez o que quer que fosse, mesmo quando o marido de Janina começou a violar a filha. Foram os inspectores da Sociedade Protectora dos Animais local que a socorreram, quando o marido violou o cão. O carrasco foi condenado a dois anos de prisão por maus-tratos ao animal...”

Tirando estas abencerragens da Polónia na Europa e no mundo ocidental em geral os direitos humanos começam a ser verdadeiramente respeitados. Se há trinta ou quarenta anos a violência doméstica era tida como assunto entre marido e mulher, logo ao abrigo de interferências externas, agora é tida como crime na lei e, o que é mais, socialmente reprovável. Se há uns anos atrás uns tabefes aplicados na mulher, mesmo que na via publica, eram aceitáveis e não passíveis de grandes reparos, agora são praticamente inexistentes e reprováveis.
Os direitos dos pais sobre os filhos não são absolutos. Os pais têm direitos mas os filhos também os têm. Espancar a filha ou envia-la para o convento porque se recusa a casar com quem o pai indica é agora tido como muito errado e até criminoso. Outras práticas, tidas como justas e certas durante séculos, são agora tidas como repugnantes. Temos como exemplo a escravatura, o direito do marido a matar a mulher por flagrante delito de adultério, o direito do marido sobre a mulher no que concerne à sexualidade, a proibição do divórcio, a perseguição a minorias sexuais, a pessoas doutras etnias, ou de religião diferente.
Mesmo na guerra começa a haver preocupações de não matar populações civis. É verdade que há muitos abusos mas a verdade é que há um século atrás o que se passou em Abu Ghabi no Iraque longe de indignar quem quer que fosse era tido como um comportamento mais que aceitável e até benevolente. O genocídio era prática corrente.
Parece, a grosso modo, que a humanidade por volta do século XVIII começou a tomar consciência de direitos e deveres até aí desconhecidos. Começou por se abolir a escravatura, regra geral com a pena de morte, com os castigos corporais.
Nos últimos anos o cenário é de uma mudança notável. Práticas tidas como bons comportamentos: o trabalho infantil, a proibição do acesso aos anticoncepcionais, o direito à sexualidade, a igualdade entre os sexos, são apenas alguns exemplos.
Por muito que custe às religiões há uma claro correlação entre influencia das igrejas na sociedade civil e o grau de liberdade que essa sociedade goza. Parece, à primeira vista, que quanto mais influencia tem a igreja na sociedade menos liberdade é dada às pessoas.
Isto dito assim parece dum anti-clericalismo básico muito à século XIX.
Eu com isto não quero dizer que todo o mal ao mundo vem da Igreja Católica. Não! As igrejas Protestantes, Islâmicas e uma infinidade de confissões cristãs fazem, u pelo menos tentam, fazer o mesmo.
Vejamos o caso de Portugal. A maioria dos portugueses é vagamente Católicos Romanos. Isto é: baptizam os filhos, vão à igreja em casamentos e funerais.
A doutrina da igreja pouco ou nada influencia o comportamento dos portugueses no dia a dia. Mesmo que saibam que a igreja proíbe o uso de preservativos ou anti concepcionais os pais portugueses aconselham os filhos a “tomarem cuidados”.
Poucas pessoas deixam de divorciar-se por causa da doutrina.
O mesmo se passa nos países protestantes e até em alguns sectores islâmicos como na Turquia ou em Marrocos.
Continua-se a ser nominalmente protestante, católico ou islâmico mas sem qualquer respeito pelas normas impostas pela religião.
Noutros países, infelizmente, a influencia religiosa ainda é muito forte. Aí, como é de esperar passam-se as maiores barbaridades.
O que me parece, e salvo melhor opinião, é que o paradigma religioso, nomeadamente o cristão, baseia-se em textos e doutrinas que estavam muito bem adaptadas a uma fase da humanidade. As coisas funcionaram muito bem de acordo com as regras do Velho Testamento, com uma pitada de humanidade dada pelo Novo.
Chegou e satisfez as pessoas durante muito tempo.
O problema é que agora estas regras começam a ser imorais, ilegais e ilícitas.

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