Furtado aqui
«Felizes esses monges que, pelo final da Idade Média, corriam de cidade em cidade a anunciar o fim do mundo! As suas profecias demoravam anos a realizar-se? Que importa isso! Eles podiam desenfrear-se, dar livre curso aos seus pavores, descarregá-los sobre as multidões; – terapêutica ilusória numa época como a nossa, em que o pânico, tendo-se introduzido nos costumes, perdeu as suas virtudes.
(…)
Para manipular os homens, é preciso praticar os seus vícios e acrescentar-lhes outros. Veja-se o exemplo dos papas: enquanto eles fornicavam, se entregavam ao incesto e assassinavam, dominavam o século; e a Igreja era toda-poderosa. Desde que respeitam os preceitos, mais não fizeram do que decair: a abstinência, tal como a moderação, ter-lhes-á sido fatal; tornados respeitáveis, já ninguém os receia. Crepúsculo edificante de uma instituição.»
[E. M. Cioran, Silogismos da Amargura; trad. Manuel de Freitas, Letra Livre, Lisboa 2009]
Selecção de Jorge Fallorca
Sem comentários:
Enviar um comentário