Blog dum gajo do Porto acerca de gaijas, actualidade política e sem futebol. Aqui o marmelo não gosta de futebol

terça-feira, 29 de novembro de 2005

Esclarecimento acerca da secção malandrices e Parecem malandrices mas não são.

O Sousita, embora às vezes tenha uns posts politicamente incorrectos e que parecem até homofóbicos, é liberal e tudo.
Agora há uma grande diferença entre consentimento e não consentimento.
A página http://www.sofiasexy.com/ é mesmo sobre o não consentimento.
E, em casos como este, não é só o traficante que é culpado mas também o cliente e quem viu ou soube e se borrifou…

Não é o que parece


Não é o que parece. O link está na secção:

Parecem malandrices mas não são

Com o nome : ver e meditar.

Recordando Eça

Não dava tão pouco ideias, porque, apesar da sua alta ilustração, que o torna um dos nossos grandes contemporâneos, a sua prudência, a sua reserva eram tais, que raras vezes se lhe tinha ouvido uma opinião nítida.
Sabia-se que aquela fronte um pouco calva, de entradas largas, estava recheada de ideias; somente conservava-as como um tesouro escondido. Era, por assim dizer, um avaro intelectual. As suas ideias eram para si; no silêncio do seu gabinete, agitava-as como o velho Grandet agitava o seu ouro, regalando-se do seu brilho e da sua sonoridade. Mas se alguém entrava de repente, aferrolhava tudo à pressa no cofre do cérebro, e a sua larga testa, de entradas altas, não oferecia mais que uma fachada impenetrável e monumental, que impressionava a todos e não aproveitava a ninguém.
Era alto, encorpado, e os seus olhos, azulados e redondos, tinham uma singular falta de expressão e de intenção. Porém, todos sabiam que por trás daquele olhar parado um mundo de ideias fermentava.
É curioso observar quantos homens públicos do nosso país têm esta aparência apagada, vazia, vaga, abstracta, sonâmbula; e, todavia, eu que pelo Conde fui admitido a conhecê-los, sei quanto génio habita em segredo naquelas cabeças calvas ou cabeludas, a que os superficiais, não lhes conhecendo as secretas riquezas, acham um aspecto alvar. É que nós somos uma raça reservada, inimiga da ostentação e das atitudes: ao inverso dos franceses, que mal têm uma ponta de talento, tratam de o fazer brilhar, reluzir, deslumbrar, nós, com vastidões de génio no interior, desprezamos estas demonstrações vaidosas e guardamos para nós mesmos as nossas riquezas intelectuais. Assim faz o árabe, que cerca os seus jardins deliciosos e as suas habitações douradas de um muro negro de pedra e lama, de modo que se julga ver uma cabana onde realmente existe uma Alhambra! Mas não somos nós de raça árabe?
Por isso nunca o Conselheiro Gama Torres se dignou fazer à Bandeira Nacional a esmola de uma ideia. Deu-lhe, porém, a protecção do seu nome; dizia-se «a Bandeira do Gama Torres» e isto trazia ao jornal uma autoridade imprevista.
Muitas vezes, segundo me contou o Conde, durante os meses de Estio em que a política, refugiada na sombra das quintas ou na frescura das praias, dormita, o redactor da Bandeira, sem assunto para o seu artigo de fundo, recorria ao génio do Conselheiro, como um pobre envergonhado. Gama Torres, porém, colocando-se no meio da casa, as pernas afastadas, o ventre saliente, as mãos atrás das costas, fitava o soalho e bamboleando o crânio fecundo, murmurava surdamente:
– Ele há muitas questões!... Há questões terríveis. Há a prostituição... o pauperismo... Ele há muitas questões...
Mas, repito-o, era um avaro intelectual que não gostava de fazer a esmola de uma ideia. Não o censuro, pois é sabido que ele dava todo o seu tempo e todo o seu génio às grandes questões sociais. Elas preocupavam-no tanto que era usual – sempre que diante dele se falava de assuntos políticos – ouvi-lo murmurar soturnamente:
– Ele há muitas questões! Questões terríveis: o pauperismo, a prostituição! São grandes questões! Questões terríveis!
E pareciam com efeito terríveis essas questões, de uma tenebrosidade de abismo, quando se via o olhar esgazeado com que ele parecia contemplá-las mentalmente.
Pouco tempo antes da sua morte, lembro-me de o ter visto, uma noite, em Casa do Conde, numa ocasião de crise ministerial, e nunca esquecerei a terrível impressão que me deixou aquele grande homem, de pé no meio da sala, esgazeando o olhar em redor e dizendo cavamente:
– Os senhores podem crê-lo, nem tudo são chalaças; ele há questões terríveis... A prostituição, o pauperismo, o ultramontanismo... Questões terríveis.
E no silêncio apavorado que deixara aquela voz profética, em que se sentia a ameaça de graves tormentas sociais rolando do fundo do horizonte, aproximei-me instintivamente do Conde, como quem procura asilo seguro.


O Conde d'Abranhos
Eça de Queirós

segunda-feira, 28 de novembro de 2005

Yo soy un hombre sincero
De donde crece la palma.
Y antes de morirme quiero
Echar mis versos del alma.
Yo vengo de todas partes,
Y hacia todas partes voy:
Arte soy entre las artes,
En los montes, monte soy.
Yo sé los nombres extraños
De las yerbas y las flores,
Y de mortales engaños,
Y de sublimes dolores.


He visto vivir a un hombre
Con el puñal al costado,
Sin decir jamás el nombre
De aquella que lo ha matado.
Rápida, como un reflejo,
Dos veces vi el alma, dos:
Cuando murió el pobre viejo,
Cuando ella me dijo adiós
Uma compilação do Sousa da ponte do José Marti…
E, sem saber nada de poesia, o que mais me dá gozo é:

Cultivo una rosa blanca,
En julio como en enero,
Para el amigo sincero
Que me da su mano franca.

Y para el cruel que me arranca
El corazón con que vivo
Cardo ni oruga cultivo:
Cultivo la rosa blanca.


Claro que há outros, mas depois d isto vale apenas mais? Vale:

Por donde abunda la malva
Y da el camino un rodeo,
Iba un ángel de paseo
Con una cabeza calva.


¡Otro ¡


Vino el médico amarillo
A darme su medicina,
Con una mano cetrina
Y la otra mano al bolsillo:
¡Yo tengo allá en un rincón
Un médico que no manca
Con una mano muy blanca
Y otra mano al corazón!

Viene, de blusa y casquete,
El grave del repostero,
A preguntarme si quiero
O Málaga o Pajarete:
¡Díganle a la repostera
Que ha tanto tiempo no he visto,
Que me tenga un beso listo
Al entrar la primavera!

Uma busca no baú.


Nem digo qual a origem nem…
Era uma vez em Portugal

À maneira do Eça

O procurador compôs logo um relatório a enumerar os inconvenientes do casarão: o maior era necessitar tantas obras e tantas despesas; depois, a falta dum jardim devia ser muito sensível a quem saía dos arvoredos de Boliqueime; e por fim aludia mesmo a uma lenda, segundo a qual eram sempre fatais aos Cavaco as paredes de Belém, «ainda que (acrescentava ele numa frase meditada) até me envergonho de mencionar tais frioleiras neste século de Voltaire, Guisot e outros filósofos liberais...»

À maneira de Saramago...

No dia seguinte nenhuma mulher falou. O facto, por absolutamente contrário às normas da vida, causou nos espíritos uma perturbação enorme, efeito em todos os aspectos justificado, basta que nos lembremos de que não havia notícia nos quarenta volumes da história universal, nem ao menos um caso para amostra, de ter alguma vez ocorrido fenómeno semelhante, passar-se um dia completo, com todas as suas pródigas vinte e quatro horas, contadas entre diurnas e nocturnas, matutinas e vespertinas, sem que tivesse sucedido que nenhuma mulher produzisse palavra, por doença, uma queda mortal, um suicídio levado a bom fim, nada de nada, pela palavra nada. Nem sequer um daqueles acidentes de automóvel tão frequentes em ocasiões festivas, quando a alegre irresponsabilidade e o excesso de álcool se desafiam mutuamente nas estradas para decidir sobre quem vai conseguir chegar à morte em primeiro lugar.

E depois, muitas peripécias e golpes de teatro, terminava o romance, ou novela dizendo:

No dia seguinte nenhuma mulher falou

What a wonderful world…

sábado, 26 de novembro de 2005

eppur si muove

O Sousita retrata-se também e afirma que as vítimas da casa pia são alegadas vitimas e que nunca viu meninos, ou meninas, nos jardins dos Jerónimos e que se alguém viu foi mera ilusão de óptica e que nunca viu, e que jura pela saúde do leitor deste blog, que nunca viu nas ruas do Porto, de Lisboa, de Évora, ou de Portalegre ou Coimbra – no choupalinho, por exemplo –, ou em qualquer outra cidade do país ou das ilhas qualquer menor com ar de quem ia prostituir-se e muito menos com a conivência, ou desleixo, das autoridades instituídas ou a instituir, ou mesmo reformadas.

Acrescenta não saber de nada e que mesmo que o soubesse ia omitir e, ou, mentir.

Nega também saber que na Avenida das Forças armadas, em Lisboa, existisse – alegadamente – um aviário frequentado pela fina flor do país e onde, alegadamente, se prostituíam menores nos anos oitenta.
O Sousita não quer dizer com isto que está acima dos tribunais. Acredita piamente que os tribunais e o sistema judicial lhe podem dar cabo da vida, chatear até à metafísica, e criar problemas do tamanho da serra da estrela.
Acredita, e isto é crer, que são ineficazes e injustos e que são lentos.
São apenas rápidos para quem chateia.
Queira Deus que os mesmos não se lembrem do Sousita e que não vão pegar em águas passadas.
Se assim for o Sousita aprenderá que o calado é o melhor.
Queira Deus que assim não seja.
No entanto se assim não for, mesmo lixado, o sousita aprenderá uma lição.
O caso casa Pia já mete, de facto nojo.

A única coisa coerente no julgamento pareceu-me a mudança de instalações para um teatro, Vasco Santana se não me engano, muito apropriado.

Quanto ao desfecho todos nós sabemos qual é:
Absolvição dos arguidos, independentemente de serem culpados ou inocentes, e o borrar de nomes de inimigos políticos ou concorrentes na comunicação social.

Faz-se assim justiça.

Parece ao Sousita, e restam muito poucas dúvidas a quem quer que seja, que houveram miúdos que foram vítimas de abusos.
Pelos relatórios apresentados parece que os miúdos da casa Pia foram abusados sexualmente pelos mais velhos e por pessoal interno da casa pia e que alguns, ou muitos, se prostituam, pública e notoriamente nos jardins de Belém e noutros locais.
E, pelos vistos eram assim há que anos sem que ninguém se importasse.

O julgamento parece-me demasiado longo.
Sejamos justos.
Se houve – e há uma grande certeza que houve vitimas – elas devem ser tomadas em primeiro lugar na consideração de tudo isto
.
Um julgamento que se arrasta por três longos anos, cujo principal arguido é liberto e que não tem fim à vista, não parece demasiado longo e ineficaz?
Como se sentirá uma vitima perante esta situação?


Há uma coisa que esse chama carisma: é a capacidade de vincular os outros, duma forma ideológica, com um determinado ponto de vista, sendo a ideologia um conjunto de pontos de vista coerentes que traduzem e propõe uma determinada visão do mundo
E o carisma não se compra. Dá-se-nos.

Todos nós sabemos que o ministério público e os tribunais são a incompetência das incompetências. È triste mas é assim. Quem quer que lide com os tribunais deste país sabe que está perante uma máquina inoperante e com pessoas, que embora muitas vezes pessoalmente sejam um doce, são no plano profissional os piores entre os piores.
A máquina que as selecciona é que tem a culpa e não elas.
Poderia contar anedota sobre a anedota dos tribunais com que lidei mas abstenho-me. Basta a vergonha de o serem e saberem que são.
Claro que ninguém de bom senso em Portugal tem a mais pequena confiança no sistema judicial. Fica-nos bem como arguidos num processo dizer que confiamos na justiça e no sistema: no sistema judicial e no das finanças e no da saúde, no do futebol e até na Nossa Senhora de Fátima.

Mas caramba! Ninguém acredita no sistema judicial. Isto sendo franco. Nós todos sabemos que aquilo é uma ficção de advogados e juízes e funcionários judiciais. Ganha quem estiver de mais má fé. Que tudo se pode, e deve fazer, a fim de protelar um processo, ou ganhar uma diligencia. Que a corrupção, o compadrio e a ineficiência são a regra. È tão fácil adiar um processo, vigarizar numa diligência e, principalmente, utilizar as falhas do sistema em proveito próprio. E que o próprio sistema, sem que ninguém se mexa , é ineficaz.

Começa o mau exemplo com os próprios juízes que se deveriam dar-se ao respeito, o que não fazem, aceitam e corroboram tudo não se dando ao respeito que a um juiz deveria ser dado como órgão de soberania. Até greves fazem!


Não será demasiado para as vitimas tudo isto?

Na minha modesta – e muito ignorante – opinião o que se devia fazer era o seguinte:

Quem pode tomar a decisão deveria colocar na boca um apito e apitar : triim ! Acabou !

O sistema judicial não pode lidar com o caso, vamos assumir o fracasso, e partir para uma solução em que se possa fazer justiça.

Vamos adquirir carisma.

Libertem-se os arguidos, já que não conseguimos provar a inocência ou a culpabilidade deles, e vamos tratar das vítimas. Indemnizemos os miúdos, tratemos deles como seres humanos a precisarem de ajuda, e vamos reformular todo o sistema de apoio a menores em Portugal.

Acabemos com as casas pias em grandes metrópoles, desviemos – o que for de desviar – do orçamento de estado, para conseguirmos um apoio à próxima geração, e vamos aprender com os erros passados.

Vamos esquecer os Tribunais.

Como disse o Sr. presidente da Republica há algum tempo:

È necessário que as pessoas entendem que as leis não são meras indicações de conduta mas antes algo a cumprir…

Quando o mais alto Magistrado da nação diz isto….

quinta-feira, 24 de novembro de 2005

Rectificação, pedidos de desculpas e punição.

Os textos que OMaia publicou como cartas do Pai Natal têm autor:

http://eroticidades.blogspot.com/

O Sousita pede desculpa ao autor e garante que eu próprio e o Ronnie vamos enrabar OMaia até sair sangue e sem vaselina.

Em alternativa ao castigo autorizamos o autor dos textos a cortar um dos testículos do citado Omaia, a sangue frio.

Fica ao critério do autor.
Os programas apresentados pelo serviço público de televisão, primeiro e segundo canal, e pelos outros canais gratuitos é quase indiscernível. Varia entre notícias, séries e enlatados americanos ou brasileiros. No meio destes há anúncios.
O serviço público é igual aos outros com a diferença que custa dinheiro ao contribuinte.
Ora como é óbvio ninguém agradece. Excepto, é claro, os sucessivos governos que ameaçam privatizar a RTP, ou pelo menos, torná-la independente do governo e que prudentemente depois de eleitos a mantêm sob o seu controlo.
Assim é e assim será.
Contra isto nada.
Agora se querem dar um verdadeiro serviço público porque não passarem aquilo que os canais de antena aberta não passam e que é demasiado caro para os milhões de reformados deste país?

Passem filmes pornográficos em vez dos programas da manhã e vão ver como os reformados aderem. Em vez do Goucha dêem o Goutcha, em vez de receitas de culinária um filme hardcore primeiro escalão.

È coisa que os velhinhos com a reforma do estado não podem sequer sonhar subscrever na TV cabo. Iam ver os votos que tinham quando dissessem, em véspera de eleições, que: A oposição se ganhar vai acabar com a TV família da manhã…
E isso sim era um verdadeiro serviço público. Dar às pessoas o que elas querem, mas não podem, ver

in illo tempore

Era no início dos anos oitenta. O local e a hora, ou o tempo e o modo, ficam no segredo dos deuses. Poderá dizer-se que era em Lisboa.

No jardim dos Jerónimos muito meninos entre os 6 e os 16 anos, prostituíam-se, publica e notoriamente, sob o olhar condescendente da policia, de Sua Ex.ª O Presidente da Republica, dos transeuntes que passavam na 24 de Julho, dos vizinhos, das visitas dos habitantes da 24 de Julho, dos seguranças de Sua Ex.ª O Presidente da Republica, das visitas e amigos que frequentavam a residência oficial de Sua Ex.ª o Presidente da Republica, da namorada do segurança das obras do futuro centro cultural de Belém, do engenheiro que fiscalizava à noite as escavações para o CCB, do policia de transito que me multou na 24 de Julho – em frente aos meninos –, de eu próprio, dos meus amigos e das visitas oficiais ao Jerónimos e do Tal e Qual, e até da Gaiola Aberta.

Perto estava um carro da polícia com dois guardas. Guardavam a ordem pública.

Enfim! Todos sabíamos que o Jardim dos Jerónimos era o jardim dos pederastas. Não dos paneleiros. Os paneleiros iam para o Parque Eduardo sétimo. Aqui era mais meninos.

Uma noite, bons tempos em que não havia álcool teste, O Sousita, quase imberbe vinha num carro de Lisboa para Cascais. Um velhote – para nós com menos de vinte alguém de mais de quarenta era velho – estava de calças baixadas e encostado a uma árvore enquanto um miúdo, para aí de dez anos lhe fazia sexo oral.

O Sousita e amigos param, saem do carro e correm para o tal velho. O puto safa-se mais rápido que o som e fica o velhote a apertar as calças e a arfar.

Grita: eu chamo a policia! E é que podia chamar! E eles estavam perto.

Certos do rigor da autoridade contra tal desatino nosso contra a ordem estabelecida e o direito sagrado do velhote de comer o puto pirámo-nos em grande velocidade para Cascais.

O velhote lá se foi. E nos também.

A polícia ficou, condescendente no seu lugar, os guardas da residência oficial de Sua Ex.ª O Presidente da Republica também, os construtores, mirones, vizinhos e residentes da 24 de Julho seguiram o seu exemplo.

Fomos ou não todos coniventes?
O Sousita, muito ateu e descrente, com licença do Altíssimo, e fruto de más companhias e péssimas leituras, conhece três tipos de padres a saber:

O heterossexual e o homossexual e omnívoro.

O primeiro gosta mesmo de mulheres. Colhe as Flores do seu rebanho – ou do rebanho alheio – e, amiga que venha é arrebanhada no amor do Senhor e dele próprio, mesmo que a dita diga e grite em voz alta, Que eu com um padre não, Que isto vai levar-me ao inferno, E que faço tudo com toda a gente mas que com frade, padre ou freira não. Nada lhe adianta. Já sabe que tem de ir ao castigo. È assim. E as raparigas lá vão, sabe Deus, com que prejuízo na salvação das suas almas. Deus lhes perdoe a todos. Penso que Deus Perdoará, até porque o dito cujo, alegadamente, é bastante competente na confissão das almas e no resto. Especialmente no resto.

O homossexual persegue homens apenas. Repugnam-lhe, como ao muçulmano o presunto, as mulheres. Revê-se em Santo Agostinho já velho, e sonha com homens. È um incomodo se queremos baptizar a afilhada na igreja na qual ele tem jurisdição e enviamos as mulheres, de mini-saia. Ele treme de indignação e delicia-se connosco.
Um chato, enfim. Depois temos de o aturar, e fugir, na Cufra. Talvez Deus lhes perdoe, mas vai obrigá-los a tomar um forte laxante antes de o receber na sua glória.

O Omnívoro come de tudo. Seja mulher, homem, menino ou menina tudo é obra de Deus e, como tal, comestível. Tem uma boa boca e o resto. Nada lhe escapa embora tenha as suas predilecções. O seu lema é : Deus nos dê muito e nos contente com pouco, e quanto mais novo melhor. Se eu fosse mau, e não sou, falaria do Padre M que tanto gostava de meninos, do meu catequista que me apalpava no ciclo preparatório os tomates com tanto carinho, do O – que não sendo padre tanto gostava de meninos, da L que tanto gostava de meninas…e enfim…de tantas criaturas do Senhor e da sua forma, por vezes peculiar, de mostrarem e demonstrem aos outros – e sabe Deus com quanta dificuldade – o amor de Cristo e de Deus Nosso Senhor pelos homens, mulheres, meninos e meninas deste vale de lágrimas. Actualmente são muito incompreendidos mesmo no seio da Santa Madre Igreja que tanto lhes deve. Esses de certeza, que são da casa e vão entrar no Reino dos Céus sem grandes formalidades.
Deus permita e ouça os escritos deste pecador e lhes conceda a todos a graça, já que a Graça e a filhas já … mas isso é outra história.
Pensa o Sousita que uma encíclica sobre a homossexualidade dos membros do clero deve ter o nome em latim. A exemplo da Libertas praestantissimum, ou da Rerum novarum, o Papa, na sua infalibilidade, deveria fazer uma nova encíclica. Acerca do cu, da mariquice, dos gays e do seu lugar na salvação das almas.

Como o tema a tratar é a paneleireisse não me parece errado, salvo melhor opinião sobre o latinorum, ou latrinorum, como quiserem classificar o latim do Sousita, um título em latim.

Aliás sempre foram os Romanos que, meticulosa e seriamente, enrabaram os cristãos até ao advento do Imperador Constantino. Todos os cristãos devem isso ao Romanos e pelos vistos não se esquecem. Pelo menos são agradecidos.

Deveria começar Sua Santidade, diz o Sousita na sua infinita ignorância, por um texto assim:

Non abusatis esfíncter nostro (ou seja em vulgar: não nos enrabem mais)

Ou

Non abafandi palheirinum nostri. (ou em vulgar: não vais levar mais no cu de mim)


Eu sei que não declinei…mas bolas…nem abafo a palheira nem escrevo latim…e antes escrever latim…

Também não sou cristão.

Penso eu que o ponto de vista de Sua Santidade é muito frutuoso e bento. Todavia um gajo que habitualmente anda de saias vir, muito histérica, verberar contra os maricas…parece-me, no mínimo, complicado. È uma ressabiada…mas o Senhor a receberá na sua glória. A glória, com letra pequena, do Senhor e não dele, claro. Seja quem for a Glória.

Todavia, como os caminhos do Senhor são insondáveis nunca se saberá quem abafará a palheirita com os amens do Senhor e quem será abafado sem os mesmos amens.

O Sousita, prudentemente, nem abafa nem deixa abafar, e espera que o Senhor o perdoe por tal falta.

Laus Deo e Deo Gratias.

quarta-feira, 23 de novembro de 2005


Destruiçao de Sodoma.

Fotografia da época.

Sacristices

Papa exclui homossexuais do sacerdócio

"Instrução" de Bento XVI não diz respeito a padres já ordenados

A Igreja exclui dos seminários e do sacerdócio quem praticar a homossexualidade, "apresentar tendências homossexuais profundas" ou apoiar a chamada "cultura gay", segundo um documento hoje divulgado.

Pretende assim Sua Santidade tornar invulneráveis os esfíncteres dos membros da Igreja a ataques e colocar alguma ordem na casa já bastante manchada por sucessivos escândalos.
A exemplo da destruição abrupta de Sodoma , cujos habitantes tinham como principal hobby o enrabanço, pretende Sua Santidade arrostar, quiçá a pontapés, para fora da Igreja os novos candidatos que tenham tendências ou comportamentos homossexuais. Aos antigos, pelos vistos, é-lhes facultado continuar. Quanto aos vícios e hábitos dos de Gomorra nada nos é dito. O Sousita treme de indignação só de pensar no que fariam. Felatio ? Sexo em grupo? Adultério? Viam os programas da TVI ?O Sousita treme e benze-se só de pensar nestas coisas.

O problema é que os habitantes de Sodoma tinham alternativa. Se se enrabavam uns aos outros faziam-no de livre e espontânea vontade. A bíblia nada nos diz acerca de alguma falta crónica de mulheres na cidade, ou de alguma característica intrínseca das suas habitantes que impedissem os sodomitas de copularem com elas. Se se sodomizavam uns aos outros era por livre iniciativa.

No caso dos membros da Igreja a coisa é diferente. Por estatuto não podem nem devem, por muito que desejem colher as flores do seu rebanho. E quem fiz Flores diz Rosas ou Marias!

Ora nessa contingência vêem-se obrigados as substituir, quiçá muitas vezes contra a sua vontade, as coxas, as mamas e ou outros atributos próprios das mulheres das suas paroquianas pelas carnes já velhas do sacristão vesgo, entradote e sempre com cheiro a aguardente barata.
Necessidades! Nem sempre lhes cairá nas mãos um acólitozito ainda imberbe, cujo - na escuridão da sacristia - e com algum esforço de imaginação pode suceder, mas não substituir, as carnes generosas de alguma paroquiana.
Acresce ao facto de terem de ouvir as mesmas paroquianas na confissão. Não nos é difícil de adivinhar, que nestes tempos de canais eróticos, revistas femininas e quejandos, as discrições das paroquianas deverão ser no mínimo bastante gráficas.
Até agora a coisa compunha-se chamando o sacristão e com alguma vaselina.
A partir de agora para os novos tudo é diferente.
Nem Marias nem Flores … nem sacristão e muito menos acólito.
Pobres membros da Igreja. Muita punheta vão tocar.

Segunda carta ao Pai Natal (trovas do vento que passa...)

Carta ao Pai Natal - Manuel Alegre


Pai natal quando voares nos céus da minha Pátria
Quando aterrares as renas nas planícies do meu País
Lembra-te desta carta, pedido singelo
De um homem que só para a Pátria pede
Para si… Nada quis.
Se o nevoeiro que levou D. Sebastião
Te fizer perder o rumo e baralhar o norte
Segue o cheiro a verde pinho
Ouve a minha trova no vento que passa
E chegarás às chaminés do meu país
Pátria desafortunada. Sem euros. Má sorte.
Numa das chaminés de Lisboa
Sentirás o odor e verás o fumo negro da traição
Que o teu trenó sobre ela paire
Que sobre a chaminé de Soares a tua rena páre
E solte bosta. Um imponente cagalhão.

Assinado: Manuel Alegre


(o plágio é do mesmo, homenagem ao anónimo)

terça-feira, 22 de novembro de 2005

Juro que não é tanga.

Para perceber o que é clicar aqui ou aqui.


5SistrsWntngHsbnds.
NwMenInTwn-Bingly&DarcyFit&Loadd.
BigSisJaneFals4B,2ndSisLizH8sDCozHes
Proud.SlimySoljrWikamSysDHsShadyPast.
TrnsOutHesActulyARlyNysGuy&RlyFancysLiz.
SheDecydsSheLyksHim.
Evry1GtsMaryd.

Por :

Five sisters wanting husbands. There are two new men in town - Bingley and Darcy. They are handsome and wealthy. Big sister Jane falls for Bingley, but second sister Elizabeth hates Darcy because of his pride. Slimy soldier Wickham says that Darcy has a shady past. It turns out that he's actually a really nice guy and really fancies Elizabeth. She decides that she likes him. Everyone gets married
PRIDE AND PREJUDICE, JANE AUSTEN
Segredo e justiça.

As escrituras de compra e venda de bens imóveis são públicas, isto é, ao contrário dos segredos e das confidências devem ser públicas. Muitos outros documentos e registo são públicos outros são confidenciais.
Ora parece que Portugal tem um problema crónico com os segredos. Se calhar pelo facto de serem segredos são mais facilmente alvo da cusquisse e daí à sua divulgação.
Ataranta-se o Sr. Procurador, irrita-se oJuiz, treme o escutado e investiga-se.
Pelo caminho da investigação não se vai a parte nenhuma. Por mais comissões de inquérito que vão agir com todo o rigor e até ás ultimas consequências, como é da praxe dizer-se, não se chega a parte nenhuma.
O Sousita tem uma solução, que não sendo a ideal, iria pelo menos impedir a divulgação dos segredos de justiça tão facilmente. E fazia-se por decreto!
Todos nós sabemos que procurar um documento, dos públicos e a que temos acesso, numa repartição pública é missão impossível. Ora o sistema está em baixo, ora o Sr. Silva – o único que sabe encontrar o processo – está doente e, muito mais frequentemente: ora bolas! Não conseguimos encontrar o processo. Por mais voltas que dê, por mais requerimentos que se faça o desgraçado não aparece.
Assim bastava o governo tornar público o segredo de justiça e sigilosos os registos públicos para facilitar a vida a toda a gente.
Quem queria um registo público bastava ir à Internet ou comprar um jornal, e o sistema judicial podia dormir descansado que nunca mais ninguém encontrava as escutas.

E mais simples, não era?

segunda-feira, 21 de novembro de 2005

A primeira de quatro cartas ao Pai Natal (a antiguidade é um posto)...

Carta ao Pai Natal - Mário Soares




Pai Natal
Acordei agora da sesta. Tive um sonho original.
Conversei com a Maria
E achamos que não é sonho
Mas uma ideia genial!
Já fui ministro, primeiro-ministro
E duas vezes presidente deste país
Está na hora de mudar de ares
Aceitar novos desafios
Levar mais longe o nome de Portugal
Ou o meu nome… Como sempre quis.
Como tu tenho já uma certa idade
E no ventre a mesma proeminência
Decidi que para o ano quero ser o Pai Natal.
Portanto…
Olha pá faz as malas. Desocupa a Lapónia.
Vou ser eu o Pai Natal.
Tem lá paciência.

Assinado: Mário Soares
(Ex-deputado. Ex-Primeiro Ministro. Ex-Presidente da Republica. Ex-Deputado europeu. Futuro Pai Natal)


Não sei quem é a vítima do plágio, senão dizia!

domingo, 20 de novembro de 2005

Sábado à noite


Final da Saudação a Walt Whitman, do tio Álvaro de Campos, em homenagem à noite de sábado.

Obrigado a T.L.

E a todos.

Quando um dia estiver num lar de terceira idade, já velhinho e muito confuso hei-de começar um relato assim:

- Era no T.L e o ano era o de 2005....

...
Abram-me todas as janelas!
Arranquem-me todas as portas!
Puxem a casa toda para cima de mim!
Quero viver em liberdade no ar,
Quero ter gestos fora do meu corpo,
Quero correr como a chuva pelas paredes abaixo,
Quero ser pisado nas estradas largas como as pedras,
Quero ir, como as coisas pesadas, para o fundo dos mares,
Com uma voluptuosidade que já está longe de mim!
Não quero fechos nas portas!
Não quero fechaduras nos cofres!
Quero intercalar-me, imiscuir-me, ser levado,
Quero que me façam pertença doída de qualquer outro,
Que me despejem dos caixotes,
Que me atirem aos mares,
Que me vão buscar a casa com fins obscenos,
Só para não estar sempre aqui sentado e quieto,
Só para não estar simplesmente escrevendo estes versos!
Não quero intervalos no mundo!
Quero a contiguidade penetrada e material dos objectos!
Quero que os corpos físicos sejam uns dos outros como as almas,
Não só dinamicamente, mas estaticamente também!
Quero voar e cair de muito alto!
Ser arremessado como uma granada!
Ir parar a... Ser levado até...
Abstracto auge no fim cie mim e de tudo!

Presidenciais

Como o Sousita vê as Presidenciais:

PRIMEIRA VELADORA - Ainda não deu hora nenhuma.
SEGUNDA - Não se pode ouvir. Não há relógio aqui perto. Dentro em pouco deve ser dia.
TERCEIRA - Não: o horizonte é negro.
PRIMEIRA - Não desejais, minha irmã, que nos entretenhamos contando o que fomos? É belo e é sempre falso. ..
SEGUNDA - Não, não falemos nisso. De resto, fomos nós alguma cousa?
PRIMEIRA - Talvez. Eu não sei. Mas, ainda assim, sempre é belo falar do passado... As horas têm caído e nós temos guardado silêncio. Por mim, tenho estado a olhar para a chama daquela vela. Às vezes treme, outras torna-se mais amarela, outras vezes empalidece. Eu não sei por que é que isso se dá. Mas sabemos nós, minhas irmãs, por que se dá qualquer cousa?...

SEGUNDA - Todo este país é muito triste... Aquele onde eu vivi outrora era menos triste. Ao entardecer eu fiava, sentada à minha janela. A janela dava para o mar e às vezes havia uma ilha ao longe... Muitas vezes eu não fiava; olhava para o mar e esquecia-me de viver. Não sei se era feliz. Já não tornarei a ser aquilo que talvez eu nunca fosse...
PRIMEIRA - Fora de aqui, nunca vi o mar. Ali, daquela janela, que é a única de onde o mar se vê, vê-se tão pouco!... O mar de outras terras é belo?
SEGUNDA - Só o mar das outras terras é que é belo. Aquele que nós vemos dá-nos sempre saudades daquele que não veremos nunca...

Fernando Pessoa, O MARINHEIRO,DRAMA ESTÁTICO EM UM QUADRO

Depois de doze minutos
Do seu drama O Marinheiro,
Em que os mais ágeis e astutos
Se sentem com sono e brutos,
E de sentido nem cheiro,
Diz rima das veladoras
Com langorosa magia
De eterno e belo há apenas o sonho.
Por que estamos nós falando ainda?
Ora isso mesmo é que eu ia
Perguntar a essas senhoras...

Álvaro de Campos
A Fernando Pessoa

(Depois de ler seu drama estático "O marinheiro" em "Orfeu I"

quinta-feira, 17 de novembro de 2005

ordinária mas apeteceu-me!



Naquela estreita, deserta região
sempre assolada pelos temporais
que entre cona e cu, em depressão,
geram grossa chuva e vendavais,

naquele curto istmo que medeia,
abandonado, entre ânus e vagina,
nessa ponte que afasta e aproxima
da fecal matéria a seminal ideia

perde-se um homem olhando o escuro
e diz para consigo – onde é que eu furo? –
e, geralmente, fura mais acima

vencida a humana incerteza,
porque da cona lhe pode vir merda
mas do cu lhe virá merda com certeza.

Fernando Correia Pina

Manuel alegre.


Amor ardente. Amor ardente. E mar.
Contar-te longamente as misteriosas
maravilhas do verbo navegar.
E mar. Amar: as coisas perigosas.

Manuel Alegre




Cuerpo de mujer mía, persistiré en tu gracia.
Mi sed, mi ansia si límite, mi camino indeciso!
Oscuros cauces donde la sed eterna sigue,
y la fatiga sigue, y el dolor infinito.

Pablo Neruda

Sem comentários.



sou uma gata
que cruza
outros gatos
na rua

quem vê gata
assanhada
logo fica
engatado

Martha Medeiros

enfim...baú!



Num impudor de estátua ou de vencida,
coxas abertas, sem defesa... nua
ante a minha vigília, a noite, e a lua,
ela, agora, descansa, adormecida.

José Régio

malandrices do baú



(Finjo que não vejo as mulheres que passam, mas vejo)

De súbito, o diabinho que me dançava nos olhos,
mal viu a menina atravessar a rua,
saltou num ímpeto de besouro
e despiu-a toda...

José Gomes Ferreira


O poema completo :


Quando você me deixou, meu bem,
Me disse pra ser feliz e passar bem.
Quis morrer de ciúme, quase enlouqueci,
Mas depois, como era de costume, obedeci.

Quando você me quiser rever
Já vai me encontrar refeita, pode crer,
Olhos nos olhos, quero ver o que você faz
Ao sentir que sem você passo bem demais.

E que venho até remoçando,
Me pego cantando
Sem mais nem porquê.
E tantas águas rolaram,
Quantos homens me amaram
Bem mais e melhor que você.

Quando talvez precisar de mim
'Ce sabe a casa é sempre sua', venha sim,
Olhos nos olhos, quero ver o que você diz,
Quero ver como suporta me ver tão feliz

do baú



olhos nos olhos, quero ver o que você diz
quero ver como suporta me ver tão feliz

Duma canção da Betanea.

mais coisas do baú. E se era a avó de algúem...ela era muito bonita!


Ah! tu nem sabias que a tua púbis
tinha a exacta medida da concha
de minha mão, nem suspeitavas
quanto de teu seio transbordaria
da outra que por trás te enlaçava.

Manuel Rodrigues

quarta-feira, 16 de novembro de 2005

Contributo para o baú do Sousa...

Uma explicação:

Eu não faço a menor ideia, ou não deveria fazer, de quem são as pessoas que publico com o título de o baú.

Se é alguém tem algo contra a publicação das fotos é só dizer-me que eu retiro-as.

Só não compreendo porque tantos emails. Não era melhor dizer o que pensam em comentário?
Sinceramente. Eu retiro o que for de retirar!

coisas do baú. Não sei quem são os actores...



O Sousa da ponte

Quando olhaste bem nos olhos meus
E o teu olhar era de adeus
Juro que não acreditei
Eu te estranhei

Chico Buarque


O Sousa da ponte

Um dia ele chegou tão diferente do seu jeito de sempre chegar
Olhou-a dum jeito muito mais quente do que sempre costumava olhar
E não maldisse a vida tanto quanto era seu jeito de sempre falar
E nem deixou-a só num canto, pra seu grande espanto convidou-a pra rodar!

Vinicius de Moraes



As línguas do inferno
São sujas, sujas como as três

Sylvia Plath


O Sousa da ponte

Oh! Como és linda, mulher que passas
Que me sacias e suplicias
Dentro das noites, dentro dos dias!

Vinicius de Moraes

mais coisas do baú. Sem data



O Sousa da ponte

Essa mulher que se arremessa, fria
E lúbrica aos meus braços, e nos seios
Me arrebata e me beija e balbucia
Versos, votos de amor e nomes feios.

Vinicius de Moraes

do baú, já com acentos...


O Sousa da ponte

Ah, se já perdemos a noção da hora
Se juntos já jogamos tudo fora
Me conta agora como hei de partir

Se, ao te conhecer, dei pra sonhar, fiz tantos desvarios
Rompi com o mundo, queimei meus navios
Me diz pra onde é que inda posso ir

Tom Jobim – Chico Buarque

Putas & Cia

Antigamente as vitimas das anedotas eram as prostitutas.

Definiam-se como mulheres de sexualidade exacerbada, que ao contrário das nossas mães e mulheres, exteriorizavam – para nosso horror e deleite – o prazer sexual e a promiscuidade duma mulher perdida que optara pela vida fácil.

Chamavam-se putas.

Se recebiam dinheiro pelo acto, normalmente contra natura, isso era um acessório.

De qualquer modo uma mulher – comme il faut – não o faria nem teria necessidade.

Faziam-no porque gostavam.

O miúdo em casa que dependia desse dinheiro, a fome, a miséria e as desgraças que lhe aconteciam eram minimizados pelo facto de ser o que era. Eram fait divers face ao estatuto de prostituta.

Os nomes que lhe chamavam eram também desculpantes dos clientes:

Mulher perdida e de vida fácil!

Como poderia um homem face a tal tentação manter-se casto?

Enfim… uma criminosa atentatória da família, da propriedade privada e, em ultima análise, do estado.

Mudam-se os tempos e mudam-se as vontades. O puto em casa, com sinais de subnutrição, é mais relevante que o comportamento da mãe.

A família não se sente atentada pela prostituta e o estado ainda menos. O cliente, caso a energúmena seja menor, vê-se na contingência de explicar ao estado o seu comportamento e de, in extremis, cumprir uma penazita de cadeia se a dita energúmena for menor.

Pode não se gostar mas isto é um passo civilizacional importante. E que de facto só acontece na tal Europa a quem custa assimilar imigrantes. E que custa ser assimilada por eles. Na mesma Europa um apresentador de televisão é detido por suspeita de abusar de menores e a culpa não é dos menores mas, se provada, dele.

Pode ser que tudo isto que escrevi seja um horror para um magrebino. Putas são putas e merecem o tratamento que lhe dão. Se os putos levavam na bilha era porque a culpa era deles.

Pode ser. No entanto o Sousita é um chato e continua a achar (doxa e não episteme) que se calhar tem alguma razão.

Talvez a nossa civilização, com todos os erros que tem, é mais justa – ou pelo menos injusta – que outras.

Presidenciais e outras

Se não fossem eleições presidenciais mas uma operação daquelas complicadas, com tripas cá fora, cortes vários nas vísceras, pace-maker, limpeza de veias e artérias e – de não somenos importância – risco sério de vida e o hospital me desse à escolha dois cirurgiões:

Um, que se bem que tivesse exercido dez anos cirurgia e se andasse a preparar para ser cirurgião mor do hospital durante outros tantos, insistia que não era cirurgião profissional e que estava um bocadito fora da cirurgia.

O outro dizia que era profissional, que sempre o fora, mas tinha oitenta anos. E que o outro também era profissional.

Cá o Sousita pirava-se.

Presidenciais e outras

Duma maneira muito simplista podemos definir poder como a capacidade de exercer a nossa vontade sobre ou outros mesmo que os malandros reajam um bocadito mal.
Também duma maneira muito simplista podemos definir a politica como a ciência, ou arte, de conquistar, exercer e manter o poder.

Com bastante simplicidade pode dizer-se que um politico pretende exercer a sua vontade sobre os outros, no maior período de tempo.

Assim sendo a apresentação dum candidato a um cargo político, seja ele qual for, deveria começar com uma introdução do género:

-Eu, fulano de tal, sou o mais capaz de exercer as funções de (presidente da Câmara, vereador, Presidente da Republica, etc.) porque desejo exercer este poder a fim de (e agora vinha o programa)

Na realidade as razões apontadas são muito mais subjectivas:

- Ouvida a sociedade civil fui chamado…

- Instado para exercer o cargo…

- É com grande sacrifício pessoal que…

- Quase obrigado a exercer este cargo…

- Não era minha vontade voluntariar-me para tão alta missão….

- O país profundo chama-me…

etc. e etc.

Ora se os políticos, que por definição devem ter a vontade expressa de exercer o poder, não o dizem clara e inequivocamente como podemos nós, simples eleitores, ter confiança em tais criaturas?

quarta-feira, 9 de novembro de 2005



O Sousa da ponte
O Sousita acha o Saramago enquanto pessoa um chato do caraças.
Agora que é um grande escritor é.

Aqui vai um bocadito do último livro.

Ide comprar malandros…que eu não o vou digitalizar. Alem do mais é ilegal e o livro vale mesmo a pena….


A coisa começa assim:


No dia seguinte ninguém morreu. O facto, por absolutamente contrário às normas da vida, causou nos espíritos uma perturbação enorme, efeito em todos os aspectos justificado, basta que nos lembremos de que não havia notícia nos quarenta volumes da história universal, nem ao menos um caso para amostra, de ter alguma vez ocorrido fenómeno semelhante, passar-se um dia completo, com todas as suas pródigas vinte e quatro horas, contadas entre diurnas e nocturnas, matutinas e vespertinas, sem que tivesse sucedido um falecimento por doença, uma queda mortal, um suicídio levado a bom fim, nada de nada, pela palavra nada. Nem sequer um daqueles acidentes de automóvel tão frequentes em ocasiões festivas, quando a alegre irresponsabilidade e o excesso de álcool se desafiam mutuamente nas estradas para decidir sobre quem vai conseguir chegar à morte em primeiro lugar. A passagem do ano não tinha deixado atrás de si o habitual e calamitoso regueiro de óbitos, como se a velha átropos da dentuça arreganhada tivesse resolvido embainhar a tesoura por um dia. Sangue, porém, houve-o, e não pouco. Desvairados, confusos, aflitos, dominando a custo as náuseas, os bombeiros extraíam da amálgama dos destroços míseros corpos humanos que, de acordo com a lógica matemática das colisões, deveriam estar mortos e bem mortos, mas que, apesar da gravidade dos ferimentos e dos traumatismos sofridos, se mantinham vivos e assim eram transportados aos hospitais, ao som das dilacerantes sereias das ambulâncias. Nenhuma dessas pessoas morreria no caminho e todas iriam desmentir os mais pessimistas prognósticos médicos, Esse pobre diabo não tem remédio possível, nem valia a pena perder tempo a operá-lo, dizia o cirurgião à enfermeira enquanto esta lhe ajustava a máscara à cara. Realmente, talvez não houvesse salvação para o coitado no dia anterior, mas o que estava claro é que a vítima se recusava a morrer neste. E o que acontecia aqui, acontecia em todo o país. Até à meia-noite em ponto do último dia do ano ainda houve gente que aceitou morrer no mais fiel acatamento às regras, quer as que se reportavam ao fundo da questão, isto é, acabar-se a vida, quer as que atinham às múltiplas modalidades de que ele, o referido fundo da questão, com maior ou menor pompa e solenidade, usa revestir-se quando chega o momento fatal. Um caso sobre todos interessante, obviamente por se tratar de quem se tratava, foi o da idosíssima e veneranda rainha-mãe. Às vinte e três horas e cinquenta e nove minutos daquele dia trinta e um de dezembro ninguém seria tão ingénuo que apostasse um pau de fósforo queimado pela vida da real senhora. Perdida qualquer esperança, rendidos os médicos à implacável evidência, a família real, hierarquicamente disposta ao redor do leito, esperava com resignação o derradeiro suspiro da matriarca, talvez umas palavrinhas, uma última sentença edificante com vista à formação moral dos amados príncipes seus netos, talvez uma bela e arredondada frase dirigida à sempre ingrata retentiva dos súbditos vindouros. E depois, como se o tempo tivesse parado, não aconteceu nada. A rainha-mãe nem melhorou nem piorou, ficou ali como suspensa, baloiçando o frágil corpo à borda da vida, ameaçando a cada instante cair para o outro lado, mas atada a este por um ténue fio que a morte, só podia ser ela, não se sabe por que estranho capricho, continuava a segurar. Já tínhamos passado ao dia seguinte, e nele, como se informou logo no princípio deste relato, ninguém iria morrer.
A tarde já ia muito adiantada quando começou a correr o rumor de que, desde a entrada do novo ano, mais precisamente desde as zero horas deste dia um de janeiro em que estamos, não havia constância de se ter dado em todo o país um só falecimento que fosse. Poderia pensar-se, por exemplo, que o boato tivesse tido origem na surpreendente resistência da rainha-mãe a desistir da pouca vida que ainda lhe restava, mas a verdade é que a habitual parte médica distribuída pelo gabinete de imprensa do palácio aos meios de comunicação social não só assegurava que o estado geral da real enferma havia experimentado visíveis melhoras durante a noite, como até sugeria, como até dava a entender, escolhendo cuidadosamente as palavras, a possibilidade de um completo restabelecimento da importantíssima saúde. Na sua primeira manifestação o rumor também poderia ter saído com toda a naturalidade de uma agência de enterros e trasladações, Pelos vistos ninguém parece estar disposto a morrer no primeiro dia do ano, ou de um hospital, Aquele tipo da cama vinte e sete não ata nem desata, ou do porta-voz da polícia de trânsito, É um autêntico mistério que, tendo havido tantos acidentes na estrada, não haja ao menos um morto para exemplo. O boato, cuja fonte primigénia nunca foi descoberta, sem que, por outro lado, à luz do que viria a suceder depois, isso importasse muito, não tardou a chegar aos jornais, à rádio e à televisão, e fez espevitar imediatamente as orelhas a directores, adjuntos e chefes de redacção, pessoas não só preparadas para farejar à distância os grandes acontecimentos da história do mundo como treinadas no sentido de os tornar ainda maiores sempre que tal convenha. Em poucos minutos já estavam na rua dezenas de repórteres de investigação fazendo perguntas a todo o bicho-careta que lhes aparecesse pela frente, ao mesmo tempo que nas fervilhantes redacções as baterias de telefones se agitavam e vibravam em idênticos frenesis indagadores. Fizeram-se chamadas para os hospitais, para a cruz vermelha, para a morgue, para as agências funerárias, para as polícias, para todas elas, com compreensível exclusão da secreta, mas as respostas iam dar às mesmas lacónicas palavras, Não há mortos. Mais sorte teria aquela jovem repórter de televisão a quem um transeunte, olhando alternadamente para ela e para a câmara, contou um caso vivido em pessoa e que era a exacta cópia do já citado episódio da rainha-mãe, Estava justamente a dar a meia-noite, disse ele, quando o meu avô, que parecia mesmo a ponto de finar-se, abriu de repente os olhos antes que soasse a última badalada no relógio da torre, como se se tivesse arrependido do passo que ia dar, e não morreu. A repórter ficou a tal ponto excitada com o que tinha acabado de ouvir que, sem atender a protestos nem súplicas, Ó minha senhora, por favor, não posso, tenho de ir à farmácia, o avô está lá à espera do remédio, empurrou o homem para dentro do carro da reportagem, Venha, venha comigo, o seu avô já não precisa de remédios, gritou, e logo mandou arrancar para o estúdio da televisão, onde nesse preciso momento tudo estava a preparar-se para um debate entre três especialistas em fenómenos paranormais, a saber, dois bruxos conceituados e uma famosa vidente, convocados a toda a pressa para analisarem e darem a sua opinião sobre o que já começava a ser chamado por alguns graciosos, desses que nada respeitam, a greve da morte. A confiada repórter laborava no mais grave dos enganos, porquanto havia interpretado as palavras da sua fonte informativa como significando que o moribundo, em sentido literal, se tinha arrependido do passo que estava prestes a dar, isto é, morrer, defuntar, esticar o pernil, e portanto resolvera fazer marcha atrás. Ora, as palavras que o feliz neto havia efectivamente pronunciado, Como se se tivesse arrependido, eram radicalmente diferentes de um peremptório Arrependeu-se. Umas quantas luzes de sintaxe elementar e uma maior familiaridade com as elásticas subtilezas dos tempos verbais teriam evitado o quiproquó e a consequente descompostura que a pobre moça, rubra de vergonha e humilhação, teve de suportar do seu chefe directo. Mal podiam imaginar, porém, ele e ela, que a tal frase, repetida em directo pelo entrevistado e novamente escutada em gravação no telejornal da noite, iria ser compreendida da mesma equivocada maneira por milhões de pessoas, o que virá a ter como desconcertante consequência, num futuro muito próximo, a criação de um movimento de cidadãos firmemente convencidos de que pela simples acção da vontade será possível vencer a morte e que, por conseguinte, o imerecido desaparecimento de tanta gente no passado só se tinha devido a uma censurável debilidade de volição das gerações anteriores. Mas as cousas não ficarão por aqui. Uma vez que as pessoas, sem que para tal tenham de cometer qualquer esforço perceptível, irão continuar a não morrer, um outro movimento popular de massas, dotado de uma visão prospectiva mais ambiciosa, proclamará que o maior sonho da humanidade desde o princípio dos tempos, isto é, o gozo feliz de uma vida eterna cá na terra, se havia tornado em um bem para todos, como o sol que nasce todos os dias e o ar que respiramos. Apesar de disputarem, por assim dizer, o mesmo eleitorado, houve um ponto em que os dois movimentos souberam pôr-se de acordo, e foi terem nomeado para a presidência honorária, dada a sua eminente qualidade de precursor, o corajoso veterano que, no instante supremo, havia desafiado e derrotado a morte. Tanto quanto se sabe, não virá a ser atribuída particular importância ao facto de o avôzinho se encontrar em estado de coma profundo e, segundo todos os indícios, irreversível.
Embora a palavra crise não seja certamente a mais apropriada para caracterizar os singularíssimos sucessos que temos vindo a narrar, porquanto seria absurdo, incongruente e atentatório da lógica mais ordinária falar-se de crise numa situação existencial justamente privilegiada pela ausência da morte, compreende-se que alguns cidadãos, zelosos do seu direito a uma informação veraz, andem a perguntar-se a si mesmos, e uns aos outros, que diabo se passa com o governo, que até agora não deu o menor sinal de vida. É certo que o ministro da saúde, interpelado à passagem no breve intervalo entre duas reuniões, havia explicado aos jornalistas que, tendo em consideração a falta de elementos suficientes de juízo, qualquer declaração oficial seria forçosamente prematura, Estamos a coligir as informações que nos chegam de todo o país, acrescentou, e realmente em nenhuma delas há menção de falecimentos, mas é fácil imaginar que, colhidos de surpresa como toda a gente, ainda não estejamos preparados para enunciar uma primeira ideia sobre as origens do fenómeno e sobre as suas implicações, tanto as imediatas como as futuras. Poderia ter-se deixado ficar por aqui, o que, levando em conta as dificuldades da situação, já seria motivo para agradecer, mas o conhecido impulso de recomendar tranquilidade às pessoas a propósito de tudo e de nada, de as manter sossegadas no redil seja como for, esse tropismo que nos políticos, em particular se são governo, se tornou numa segunda natureza, para não dizer automatismo, movimento mecânico, levou-o a rematar a conversa da pior maneira, Como responsável pela pasta da saúde, asseguro a todos quantos me escutam que não existe qualquer motivo para alarme, Se bem entendi o que acabo de escutar, observou um jornalista em tom que não queria parecer demasiado irónico, na opinião do senhor ministro não é alarmante o facto de ninguém estar a morrer, Exacto, embora por outras palavras, foi isso mesmo o que eu disse, Senhor ministro, permita-me que lhe recorde que ainda ontem havia pessoas que morriam e a ninguém lhe passaria pela cabeça que isso fosse alarmante, É natural, o costume é morrer, e morrer só se torna alarmante quando as mortes se multiplicam, uma guerra, uma epidemia, por exemplo, Isto é, quando saem da rotina, Poder-se-á dizer assim, Mas, agora que não se encontra quem esteja disposto a morrer, é quando o senhor ministro nos vem pedir que não nos alarmemos, convirá comigo que, pelo menos, é bastante paradoxal, Foi a força do hábito, reconheço que o termo alarme não deveria ter sido chamado a este caso, Que outra palavra usaria então o senhor ministro, faço a pergunta porque, como jornalista consciente das minhas obrigações que me prezo de ser, me preocupa empregar o termo exacto sempre que possível. Ligeiramente enfadado com a insistência, o ministro respondeu secamente, Não uma, mas quatro, Quais, senhor ministro, Não alimentemos falsas esperanças. Teria sido, sem dúvida, uma boa e honesta manchete para o jornal do dia seguinte, mas o director, após consultar com o seu redactor-chefe, considerou desaconselhável, também do ponto de vista empresarial, lançar esse balde de água gelada sobre o entusiasmo popular, Ponha-lhe o mesmo de sempre, Ano Novo, Vida Nova, disse.
No comunicado oficial, finalmente difundido já a noite ia adiantada, o chefe do governo ratificava que não se haviam registado quaisquer defunções em todo o país desde o início do novo ano, pedia comedimento e sentido de responsabilidade nas avaliações e interpretações que do estranho facto viessem a ser elaboradas, lembrava que não deveria excluir-se a hipótese de se tratar de uma casualidade fortuita, de uma alteração cósmica meramente acidental e sem continuidade, de uma conjunção excepcional de coincidências intrusas na equação espaço-tempo, mas que, pelo sim, pelo não, já se haviam iniciado contactos exploratórios com os organismos internacionais competentes em ordem a habilitar o governo a uma acção que seria tanto mais eficaz quanto mais concertada pudesse ser. Enunciadas estas vaguidades pseudocientíficas, destinadas, também elas, a tranquilizar, pelo incompreensível, o alvoroço que reinava no país, o primeiro-ministro terminava afirmando que o governo se encontrava preparado para todas as eventualidades humanamente imagináveis, decidido a enfrentar com coragem e com o indispensável apoio da população os complexos problemas sociais, económicos, políticos e morais que a extinção definitiva da morte inevitavelmente suscitaria, no caso, que tudo parece indicar como previsível, de se vir a confirmar. Aceitaremos o repto da imortalidade do corpo, exclamou em tom arrebatado, se essa for a vontade de deus, a quem para todo o sempre agradeceremos, com as nossas orações, haver escolhido o bom povo deste país para seu instrumento. Significa isto, pensou o chefe do governo ao terminar a leitura, que estamos metidos até aos gorgomilos numa camisa-de-onze-varas. Não podia ele imaginar até que ponto o colarinho lhe iria apertar. Ainda meia hora não tinha passado quando, já no automóvel oficial que o levava a casa, recebeu uma chamada do cardeal, Boas noites, senhor primeiro-ministro, Boas noites, eminência, Telefono-lhe para lhe dizer que me sinto profundamente chocado, Também eu, eminência, a situação é muito grave, a mais grave de quantas o país teve de viver até hoje, Não se trata disso, De que se trata então, eminência, É a todos os respeitos deplorável que, ao redigir a declaração que acabei de escutar, o senhor primeiro-ministro não se tenha lembrado daquilo que constitui o alicerce, a viga mestra, a pedra angular, a chave de abóbada da nossa santa religião, Eminência, perdoe-me, temo não compreender aonde quer chegar, Sem morte, ouça-me bem, senhor primeiro-ministro, sem morte não há ressurreição, e sem ressurreição não há igreja, Ó diabo, Não percebi o que acaba de dizer, repita, por favor, Estava calado, eminência, provavelmente terá sido alguma interferência causada pela electricidade atmosférica, pela estática, ou mesmo um problema de cobertura, o satélite às vezes falha, dizia vossa eminência que, Dizia o que qualquer católico, e o senhor não é uma excepção, tem obrigação de saber, que sem ressurreição não há igreja, além disso, como lhe veio à cabeça que deus poderá querer o seu próprio fim, afirmá-lo é uma ideia absolutamente sacrílega, talvez a pior das blasfémias, Eminência, eu não disse que deus queria o seu próprio fim, De facto, por essas exactas palavras, não, mas admitiu a possibilidade de que a imortalidade do corpo resultasse da vontade de deus, não será preciso ser-se doutorado em lógica transcendental para perceber que quem diz uma cousa, diz a outra, Eminência, por favor, creia-me, foi uma simples frase de efeito destinada a impressionar, um remate de discurso, nada mais, bem sabe que a política tem destas necessidades, Também a igreja as tem, senhor primeiro-ministro, mas nós ponderamos muito antes de abrir a boca, não falamos por falar, calculamos os efeitos à distância, a nossa especialidade, se quer que lhe dê uma imagem para compreender melhor, é a balística, Estou desolado, eminência, No seu lugar também o estaria. Como se estivesse a avaliar o tempo que a granada levaria a cair, o cardeal fez uma pausa, depois, em tom mais suave, mais cordial, continuou, Gostaria de saber se o senhor primeiro-ministro levou a declaração ao conhecimento de sua majestade antes de a ler aos meios de comunicação social, Naturalmente, eminência, tratando-se de um assunto de tanto melindre, E que disse o rei, se não é segredo de estado, Pareceu-lhe bem, Fez algum comentário ao terminar, Estupendo, Estupendo, quê, Foi o que sua majestade me disse, estupendo, Quer dizer que também blasfemou, Não sou competente para formular juízos dessa natureza, eminência, viver com os meus próprios erros já me dá trabalho suficiente, Terei de falar ao rei, recordar-lhe que, em uma situação como esta, tão confusa, tão delicada, só a observância fiel e sem desfalecimento das provadas doutrinas da nossa santa madre igreja poderá salvar o país do pavoroso caos que nos vai cair em cima, Vossa eminência decidirá, está no seu papel, Perguntarei a sua majestade que prefere, se ver a rainha-mãe para sempre agonizante, prostrada num leito de que não voltará a levantar-se, com o imundo corpo a reter-lhe indignamente a alma, ou vê-la, por morrer, triunfadora da morte, na glória eterna e resplandecente dos céus, Ninguém hesitaria na resposta, Sim, mas, ao contrário do que se julga, não são tanto as respostas que me importam, senhor primeiro-ministro, mas as perguntas, obviamente refiro-me às nossas, observe como elas costumam ter, ao mesmo tempo, um objectivo à vista e uma intenção que vai escondida atrás, se as fazemos não é apenas para que nos respondam o que nesse momento necessitamos que os interpelados escutem da sua própria boca, é também para que se vá preparando o caminho às futuras respostas, Mais ou menos como na política, eminência, Assim é, mas a vantagem da igreja é que, embora às vezes o não pareça, ao gerir o que está no alto, governa o que está em baixo. Houve uma nova pausa, que o primeiro-ministro interrompeu, Estou quase a chegar a casa, eminência, mas, se me dá licença, ainda gostaria de lhe pôr uma breve questão, Diga, Que irá fazer a igreja se nunca mais ninguém morrer, Nunca mais é demasiado tempo, mesmo tratando-se da morte, senhor primeiro-ministro, Creio que não me respondeu, eminência, Devolvo-lhe a pergunta, que vai fazer o estado se nunca mais ninguém morrer, O estado tentará sobreviver, ainda que eu muito duvide de que o venha a conseguir, mas a igreja, A igreja, senhor primeiro-ministro, habituou-se de tal maneira às respostas eternas que não posso imaginá-la a dar outras, Ainda que a realidade as contradiga, Desde o princípio que nós não temos feito outra cousa que contradizer a realidade, e aqui estamos, Que irá dizer o papa, Se eu o fosse, perdoe-me deus a estulta vaidade de pensar-me tal, mandaria pôr imediatamente em circulação uma nova tese, a da morte adiada, Sem mais explicações, À igreja nunca se lhe pediu que explicasse fosse o que fosse, a nossa outra especialidade, além da balística, tem sido neutralizar, pela fé, o espírito curioso, Boas noites, eminência, até amanhã, Se deus quiser, senhor primeiro-ministro, sempre se deus quiser, Tal como estão as cousas neste momento, não parece que ele o possa evitar, Não se esqueça, senhor primeiro-ministro, de que fora das fronteiras do nosso país se continua a morrer com toda a normalidade, e isso é um bom sinal, Questão de ponto de vista, eminência, talvez lá de fora nos estejam a olhar como um oásis, um jardim, um novo paraíso, Ou um inferno, se forem inteligentes, Boas noites, eminência, desejo-lhe um sono tranquilo e reparador, Boas noites, senhor primeiro-ministro, se a morte resolver regressar esta noite, espero que não se lembre de o ir escolher a si, Se a justiça neste mundo não é uma palavra vã, a rainha-mãe deverá ir primeiro que eu, Prometo que não o denunciarei amanhã ao rei, Quanto lhe agradeço, eminência, Boas noites, Boas noites.
Eram três horas da madrugada quando o cardeal teve de ser levado a correr ao hospital com um ataque de apendicite aguda que obrigou a uma imediata intervenção cirúrgica. Antes de ser sugado pelo túnel da anestesia, naquele instante veloz que precede a perda total da consciência, pensou o que tantos outros têm pensado, que poderia vir a morrer durante a operação, depois lembrou-se de que tal já não era possível, e, finalmente, num último lampejo de lucidez, ainda lhe passou pela mente a ideia de que se, apesar de tudo, morresse mesmo, isso significaria que teria, paradoxalmente, vencido a morte. Arrebatado por uma irresistível ânsia sacrificial ia implorar a deus que o matasse, mas já não foi a tempo de pôr as palavras na sua ordem. A anestesia poupou-o ao supremo sacrilégio de querer transferir os poderes da morte para um deus mais geralmente conhecido como dador da vida.




As Intermitências da Morte.

terça-feira, 8 de novembro de 2005

Sobre a França

A Comuna surgiu de maneira espontânea, ninguém a preparou de modo consciente e sistemático. A funesta guerra com a Alemanha, os sofrimentos do assédio, o desemprego operário e a ruína da pequena burguesia; a indignação das massas contra as classes superiores e as autoridades que haviam demonstrado uma incapacidade absoluta; a surda efervescência no seio da classe operária, descontente de sua situação e ansiosa por um novo regime social; a composição reaccionária da Assembleia Nacional, que fazia temer os destinos da república foram as causas que concorreram com outras muitas para impulsionar a população parisiense para a revolução do 18 de Março.

Em Memória da Comuna, V. I. Lenine, 1911

Sobre a França

Millions of expatriate workers facing maltreatment and injustice in the Middle East and the Gulf are a time bomb that could unleash riots like those rocking France, an Arab-American activist has warned.
"France and the rest of Europe are learning now that 'guest workers', in their third generation and still denied justice, are not only a shame that eats at the moral fibre of a society, they are also a time bomb waiting to explode," said James Zogby, President of the Arab American Institute, on Monday.

http://english.aljazeera.net/NR/exeres/E306BDF9-FCE1-4835-8698-C9BB1620A50A.htm

"France is the country where, more than anywhere else, the historical class struggles were each time fought out to a finish, and where, consequently, the changing political forms within which they move and in which their results are summarized have been stamped in the sharpest outlines. The centre of feudalism in the Middle Ages, the model country, since the Renaissance, of a unified monarchy based on social estates, France demolished feudalism in the Great Revolution and established the rule of the bourgeoisie in a classical purity unequalled by any other European land. And the struggle of the upward-striving proletariat against the ruling bourgeoisie appeared here in an acute form unknown elsewhere."
The Eighteenth Brumaire, Engels (p.4, 1907 edition)

A necessidade de se constranger trouxe-lhe o hábito de odiar; odiou sobretudo as patroas, com um ódio irracional e pueril. Tivera-as ricas, com palacetes; e pobres, mulheres de empregados, velhas e raparigas, coléricas e pacientes; — odiava-as a todas, sem diferença.

É patroa e basta! Pela mais simples palavra, pelo ato mais trivial! Se asvia sentadas: — Anda, refestela-te, que a moura trabalha! Se as via sair: — Vai-te, a negra cá fica no buraco! Cada riso delas era uma ofensa à sua tristeza doentia; cada vestido novo uma afronta ao seu velho vestido de merino tingido. Detestava-as na alegria dos filhos e nas prosperidades da casa. Rogava-lhes pragas. Se os amos tinham um dia de contrariedade, ou via as caras tristes, cantarolava todo o dia em voz de falsete a Carta adorada! Com que gosto trazia a conta retardada de um credor impaciente, quando pressentia embaraços na casa! “Este papel! — gritava com uma voz estridente — diz que não se vai embora sem uma resposta!” Todos os lutos a deleitavam — e sob o xale preto que lhe tinham comprado, tinha palpitações de regozijo. Tinha visto morrer criancinhas, e nem a aflição das mães a comovera; encolhia os ombros: “Vai dali, vai fazer outro. Cabra!



— Não que a minha vez havia de chegar! Tenho sofrido muito! Estou farta! Vá buscar o dinheiro onde quiser. Nem cinco réis de menos!

Tenho passado anos e anos a ralar-me! Pra ganhar meia moeda por mês, estafo-me a trabalhar, de madrugada até à noite, enquanto a
senhora está de pânria! É que eu levanto-me às seis horas da manhã — e é logo engraxar, varrer, arrumar, labutar, e a senhora está muito
regalada em vale de lençóis, sem cuidados nem canseiras. Há um mês que me ergo com o dia pra meter em goma, passar, engomar! A senhora suja, suja, quer ir ver quem lhe parece, aparecer-lhe com taflilarias por baixo, e cá está a negra com a pontada no coração, a matar-se, com o ferro na mão! E a senhora são passeios, tipóias, boas sedas, tudo o que lhe apetece — e a negra? A negra a esfalfar-se!
Luísa, quebrada, sem força para responder, encolhia-se sob aquela cólera como um pássaro sob um chuveiro. Juliana ia-se exaltando com a mesma violência da sua voz. E as lembranças das fadigas, das humilhações, vinham atear-lhe a raiva, como achas numa fogueira.
— Pois que lhe parece? — exclamava. — Não que eu como os restos e a senhora os bons bocados! Depois de trabalhar todo o dia, se quero uma gota de vinho, quem mo dá? Tenho de o comprar! A senhora já foi ao meu quarto? É uma enxovia! A percevejada é tanta que tenho de dormir quase vestida. E a senhora se sente uma mordedura, tem a negra de desaparafusar a cama, e de a catar frincha por frincha. Uma criada! A criada é o animal. Trabalha se podes, senão rua, para o hospital. Mas chegou-me a minha vez - e dava palmadas no peito, fulgurante de vingança. - Quem manda agora sou eu!
Luísa soluçava baixo.

O Primo Basílio, Eça de Queirós
Isto em termos práticos é mais ou menos assim:
A Europa tem sido o receptáculo de trabalhadores do terceiro mundo durante anos e anos. O crescimento económico que tínhamos a tal obrigava. Os Zé Ninguém de Portugal, do Magreb, da Turquia e de mais não sei quantos locais aportavam à Europa – na altura ainda alem Pirinéus – e trabalhando arduamente ganhavam uma guitas muito razoáveis com as quais voltavam para os países de origem e montavam um café que se chamava o Parisiano em Paços de Ferreira, ou um talho com o nome Bonn em Marraquexe, comprava uma boa casa nos padrões da merdaleja em que habitavam e eram felizes.
Nos países de acolhimento viviam para trabalhar e aforrando muito e trabalhando mais conseguiam uma quantia que era muito no seu pais de origem, sendo pouco no entanto no país onde trabalhavam. Pouco ligavam à educação dos filhos ou à sua integração porque na Europa nunca faltava trabalho para alguém que quisesse trabalhar. Era só querer. E de qualquer modo havia a segurança social.
Passou de pais para filhos a mensagem que se não quisessem voltar para a Merdaleja ou Al Merdah Leja podiam sempre ficar e trabalhar.
Claro que muitos já não se habituavam às berças pobres onde os antepassados tinham nascido e até já nem dominavam bem a língua. Como havia trabalho ia-se ficando.
Era natural que com o andar das gerações a nacionalidade deixasse de ser algo de meramente legal para ser algo de real.

No entanto o homem põe e Deus dispõe:

Resolvido o problema do comunismo com a queda do muro e o fim do socialismo real, ou lá que coisa era aquela, embandeiramos em arco. Alguns países de leste, ex-inimigos figadais passaram a aliados, entram na Nato e na U.E. Anuncia-se até o fim da história e o Pangloss urra que vivemos no melhor dos mundos.
Entretanto desarma-se as barreiras aduaneiras e deixamos entrar livremente produtos low cost. Como é óbvio as empresas mudam-se para onde a mão-de-obra é mais barata e o desemprego aumenta.
O Pangloss grita ainda pelo melhor dos mundos cheio de convicção.
O estado social é posto em causa: feitas as contas bem feitinhas é preciso cortar nas prestações sociais.
O Pangloss acrescenta que menos estado melhor estado.

Como resultado desta confusão toda temos o quê?

Uma enorme quantidade de jovens com poucas habilitações, e não só os filhos de emigrantes, afastados para todo o sempre do mercado de trabalho. Um conjunto enorme de ex operários nas casa dos quarenta e cinquenta sem emprego, sem perspectiva nenhuma de o terem e a verem as prestações sociais a diminuírem ou a acabarem.

É o terreno para uma revolução.

segunda-feira, 7 de novembro de 2005


Sem data.
O Sousa da ponte

mais coisas do baú. Sem data




Outras vezes valsando, o seio lhe palpita,
De cansaço talvez, talvez de comoção.
Quando a boca vermelha os lábios abre e agita,
Não sei se pede um beijo ou faz uma oração.

Outras vezes beijando a boneca enfeitada,
Olha furtivamente o primo que sorri;
E se corre parece, à brisa enamorada,
Abrir as asas de um anjo e tranças de uma huri.

….

Machado de Assis

do baú, sem data.



Está naquela idade inquieta e duvidosa,
Que não é dia claro e é já o alvorecer;
Entreaberto botão, entrefechada rosa,
Um pouco de menina e um pouco de mulher.

Às vezes recatada, outras estouvadinha,
Casa no mesmo gesto a loucura e o pudor;
Tem cousas de criança e modos de mocinha,
Estuda o catecismo e lê versos de amor
….

Machado de Assis

quarta-feira, 2 de novembro de 2005

do baú



O Sousa da ponte

Estas fotos eram para serem vistas num aparelho que dava a sensação de três dimensões.

Em teu crespo jardim, anêmonas castanhas
detêm a mão ansiosa: Devagar.
Cada pétala ou sépala seja lentamente
acariciada, céu; e a vista pouse,
beijo abstrato, antes do beijo ritual,
na flora pubescente, amor; e tudo é sagrado.

Carlos Drummond de Andrade

do baú


Foto sem data.
O Sousa da ponte

Não quero ser o último a comer-te.
Se em tempo não ousei, agora é tarde.
Nem sopra a flama antiga nem beber-te
aplacaria sede que não arde

em minha boca seca de querer-te,
de desejar-te tanto e sem alarde,
fome que não sofria padecer-te
assim pasto de tantos, e eu covarde

a esperar que limpasses toda a gala
que por teu corpo e alma ainda resvala,
e chegasses, intata, renascida,

para travar comigo a luta extrema
que fizesse de toda a nossa vida
um chamejante, universal poema.

Carlos Drummond de Andrade